A brochura publicitária da Casal Carina que constituiu 90% da minha informação durante muito tempo (scan da Horta); ampliação da tabela de características (ver mais características no manual do utilizador); foto existente numa oficina no Porto de uma adaptação não oficial para triciclo (existe a hipótese não confirmada que a Casal terá realmente produzido um triciclo Casal Carina, mas é pouco provável)
Publicidade da S170 (à esquerda cortesia António Valente, ao centro cortesia Hélder Pereira, todos via motorizadas50.com)
Foto de uma Carina "uniformizada" ao serviço da polícia (autor desconhecido; a mesma foto aparece num formato cortado no site da PSP); o Presidente Américo Tomás visita o stand da Casal na FIL de 1967, onde duas Carinas estão expostas (via motorizadas50.com)
No deserto de informação que é a história desta pequena scooter, eis que surge um oásis fresco e verdejante na forma de um pequeno livro: "A Metalurgia Casal, 1964-1974 - Elementos para uma cultura de empresa", de Manuel Ferreira Rodrigues, editado pela Câmara Municipal de Aveiro em 1996, 53 páginas. (este livrinho custou 3 euros e tal e adquiri-o na Livraria Municipal de Aveiro, www.bib-aveiro.rcts.pt/livraria.municipal/ [link não funciona], 234 406 483)
Nele o autor expõe com rigor a história completa da Metalurgia Casal, em paralelo com todas as circunstâncias económicas, políticas e sociais da época. Desenvolvimento de produtos, decisões estratégicas, intrigas comerciais, está tudo lá. A bibliografia é extensíssima, e inclui os arquivos da Casal e os arquivos pessoais do sr. João Casal. Entrevistas com o sr. João Casal e antigos responsáveis da empresa garantem a correcção e a profundidade da informação.
Um resumo das partes mais giras: a Metalurgia Casal é fundada em Dezembro de 1963. A empresa que lhe dá origem já importa motores Zundapp há algum tempo. O governo da altura, torcendo o nariz às importações, "convida" João Casal a fabricar motores em Portugal (sob licença alemã). E assim se faz em 64 com a assistência técnica da Zundapp, e para desagrado dos concorrentes Famel e semelhantes. O que acontece a seguir parece uma telenovela: a Casal quer produzir eventualmente a totalidade do motor, mas a Zundapp quer continuar a fornecer peças para contornar as restrições às importações. Quebram-se as relações e a Zundapp alia-se à Famel, apesar do desejo de nacionalização das autoridades responsável por esta mudança, enquanto a Casal passa a ser obrigada a fabricar motores completos, tendo agora como concorrência a Famel-Zundapp. O director técnico da Zundapp-Werke GmbH, Eng. Robert Erich Zipprich, manda os alemães às urtigas e vem trabalhar para Aveiro. Foram dois primeiros anos movimentados!
Em Junho de 66 inicia-se a produção do motor Casal, seguida alguns meses depois, pela Carina. As motorizadas apareceram apenas mais tarde porque a estratégia na altura era não fazer concorrência aos fabricantes de motorizadas que compravam os motores Casal. A firma vai crescendo e lançando novos produtos, e goza de sucesso no estrangeiro. Em 71, até se iniciam estudos sérios para a produção de um automóvel ligeiro nacional, mas o projecto não dá resultados. E é isto, o livro concentra-se nos primeiros 10 anos de actividade.
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A empresa fechou no fim da década de 90. Como sempre, apareceram alguns potenciais investidores mas a coisa nunca foi para a frente. Ouvi relatos que dizem que muitas peças sobresselentes estavam no chão, expostas aos elementos, e que muitas foram queimadas. Parte das instalações foi vendida e demolida, para se proceder à construção de grandes superfícies comerciais. A demolição foi feita sem preocupação em preservar a história e espólio da Metalurgia Casal, tendo sido destruídos arquivos, registos, e peças no mínimo interessantes.
O edifício principal e uma fila de armazéns ainda estão de pé. Os armazéns abandonados e as peças de plástico espalhadas pela erva alta têm uma qualidade fantasmagórica, e dão uma ideia da grandeza passada deste magnífico local. Ao lado encontra-se um concessionário da Suzuki. Creio que não se trata de coincidência já que o site http://www.veiculoscasal.pt/ se revela o site de um revendedor dessa marca.
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Vista geral com concessionário Suzuki, edifício da gerência e fila de armazéns; Fila de armazéns; Local das instalações demolidas na actualidade
Nas minhas pesquisas em busca de mais informação, obtive algum (pouco) sucesso. Consegui achar os manuais de peças sobresselentes em baixo, infelizmente não para o motor M153 específico da Carina. Falei com um pica da época que me contou, com detalhes hilariantes e
esbracejar de braços violento, como ele e os amigos iam pelos campos à noite, até ao terreno atrás da fábrica onde os cilindros com defeitos (alhetas partidas) eram amontoados para serem refundidos, tentando iludir os guardas; como passavam por baixo da rede e roubavam cilindros novos para poderem continuar os seus picanços. Falei com um velhote que tinha a Carina cinzenta da foto desde nova, com tudo de origem. Falei com outro que tinha mandado pintar a sua Carina na própria fábrica. Outro garageiro contou-me a história de uma pilha de tapetes de chão da Carina que ficaram a apodrecer no terreno da fábrica, para quem os quisesse levar. E recentemente foi vendida uma Carina zero quilómetros que estava esquecida num stand em Albergaria... Ainda tenho mais algumas pistas para seguir, e nunca se sabe quem pode ler isto na internet... The truth is out there...
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